quinta-feira, 8 de maio de 2014

O caminho do tráfico até a boleia do caminhão

Em Uruguaiana, quatro quadrilhas vendem drogas e agenciam garotas e garotos

Ex-caminhoneiro que trocou a carreta pelo tráfico, abastace os colegas na Fonteira do Brasil
Crédito: Mauro Schaefer
Em Uruguaiana é possível comprar rebite, cocaína e inclusive armas. Um traficante de 52 anos concordou em falar com o Correio do Povo, desde que o encontro fosse na periferia da cidade e sem fotografia. O horário foi marcado para a madrugada de 23 de abril. No local combinado - uma rua sem calçamento e parca iluminação -, ele encontrou a reportagem.

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Em princípio, parecia desconfiado. Depois aceitou contar como funciona o mundo das drogas na cidade. Segundo ele, quatro quadrilhas de traficantes dividem a área na vila Cobec. De comum acordo, agenciam a prostituição e negociam drogas. "Ali, o caminhoneiro encontra o rebite. O sexo, seja com garotas ou garotos, é oferecido normalmente", revela. "O motorista é que escolhe quem ele quer", afirma o traficante que diz se chamar Marcos. "E, a maioria desses adolescentes faz isso com o conhecimento dos pais", atesta.

O rebite vem, em grande parte, da Argentina, onde a venda é liberada e a fiscalização na Aduana, do lado argentino, não é muito rigorosa com pequenos pacotes, se preocupando mais com o que está no porta-malas. A cocaína é fornecida por traficantes da região. O mais irônico, segundo Marcos, é que os caminhoneiros brasileiros evitam usar o rebite quando estão em solo argentino. "Parece piada, mas na Argentina é o Exército que patrulha as estradas", revela. "E eles são bem pouco simpáticos aos brasileiros", ressalta o traficante, que foi caminhoneiro durante 20 anos e deixou a profissão devido a problemas cardíacos, resultantes do consumo excessivo de rebite. Atualmente, Marcos fornece drogas - essencialmente rebite - para ex-colegas de profissão e, por isso, mantém uma rivalidade com opositores no submundo. O ex-caminhoneiro se diz jurado de morte.

Nos bares, droga e sexo à vontade

Na região da Fronteira-Oeste, um gueto, conhecido como vila da Cobec, é o ponto para conseguir cocaína e rebite. Ao lado do Porto Seco da cidade e a poucos quilômetros da Argentina, a droga, via de regra, vem por telentrega. E são alguns motociclistas - Uruguaiana permite o serviço de moto-táxi - que levam a quantidade pedida pelos clientes, entre eles caminhoneiros.

O local está situado estrategicamente bem ao lado do estacionamento do porto, limitado por uma cerca de tela. Poucos metros separam os caminhoneiros dos bares existentes - identificados pela luz vermelha, na varanda -, onde eles conseguem drogas e sexo.

Na madrugada de 22 de abril, quando as equipes do Correio do Povo e da TV Record RS estiveram no lugar, estava tudo vazio. Na manhã daquele dia, a Polícia havia dado uma batida e afastado os frequentadores.

O lugar é um mundo à parte. Ruas de chão batido e com o esgoto correndo a céu aberto, malocas se aglomeram na parte dos fundos do terreno dos "bares" ou junto deles. Nas festas promovidas há oferta de drogas e garotas, muitas adolescentes.

Em 23 de abril, uma ação do Batalhão de Áreas Turísticas de Fronteira prendeu um rapaz de 26 anos, suspeito de ser um "aviãozinho" - gíria usada para definir o mensageiro do traficante. Os PMs seguiam na direção da BR 290, quando avistaram o rapaz, numa motocicleta, seguindo na direção oposta. Assustado com os policiais, empreendeu maior velocidade. Foi preso logo depois. Não foi encontrada droga com ele. Possivelmente, jogou fora. Na agenda de seu celular estavam gravados números de traficantes da cidade.

Travestis atuam no tráfico

Em Santa Catarina, travestis se arriscam na BR 470, quase no acesso a Blumenau. Eles, segundo um comerciante da região, servem como revendedores de drogas. Automóveis e caminhões começam a parar no local no final da noite. No lugar há uma parada de ônibus, que é usada para descansar por alguns travestis ou para negociar com algum cliente que se disponha a descer do veículo.

Sexo e drogas podem ser comprados a qualquer momento, mas tudo a dinheiro vivo. Os travestis, inclusive, se arriscam ao cruzar a rodovia para falar com algum interessado do outro lado da pista. A estrada é muito movimentada, pois além de levar a Blumenau, é a rota para se chegar em Itajaí. E o lugar é pouco iluminado, propiciando aos "clientes" um certo anonimato, pois também fica distante do Centro de Blumenau.

"É algo incrível", diz o comerciante, estabelecido nas proximidades. "Fazem de tudo e neste local, sem se importar com quem está por perto", reclama. O comerciante relata que, em certos dias, a área lateral do estabelecimento amanhece recheada de preservativos. Outros moradores da área também reclamam do barulho feito pelos caminhões, provocado pelas freadas ou arrancadas.

Fonte: Paulo Roberto Tavares / Correio do Povo

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